O primeiro grande projeto de concessão
ferroviária do governo Michel Temer, a Ferrovia Norte-Sul (FNS) construída em
sua maior parte no governo Lula, deve teve seu edital aprovado na reunião da
diretoria da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) na semana
passada. A expectativa do secretário especial do Programa de Parcerias de
Investimentos (PPI), Adalberto Vasconcelos, é de que vários consórcios
participem do leilão, sobretudo, estrangeiros.
A
Ferrovias Russas (RZD, na sigla em russo), responsável por 85 mil quilômetros
de trilhos, promete entrar forte na disputa. “Vamos partir com tudo. No mínimo,
vamos fazer as concessionárias que já operam no país pagarem mais caro para
arrematar a Norte-Sul”, garantiu o representante dos russos no Brasil, Bernardo
Figueiredo, ex-presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL) e da
ANTT.
Na
Rússia, a RZD transporta 1 bilhão de passageiros e 1 bilhão de toneladas de
carga por ano na mesma linha, sem conflitos entre os trens. A companhia tem uma
joint venture com os chineses para viabilizar a rota Moscou-Pequim com trem de
alta velocidade, opera no Leste Europeu e iniciou obras em Cuba. “São operações
de alto nível, que podem contribuir para o sistema no Brasil”, afirmou
Figueiredo. Uma das maiores preocupações dos investidores russos, no entanto, é
a discrepância da estrutura da Norte-Sul com a malha ao Sul, controlada pela
Rumo, que tem velocidade média muito baixa. Figueiredo lembrou que a FNS foi
projetada para uma velocidade de até 80km/h, mas o governo acha normal derrubar
a média para 42km/h.
Para o
representante dos russos, o governo sinaliza que não está preocupado com a
concentração do setor nas mãos das empresas que já têm operações no país, algo
que pode travar a retomada do desenvolvimento do setor ferroviário, com a
ampliação da competição. “A FNS não chega aos portos. Para o projeto ser
atrativo, o direito de passagem é fundamental. Isso funciona no mundo inteiro,
onde o transporte ferroviário é eficiente. No Brasil, as operadoras preferem
cobrar caro para garantir o monopólio. Não à toa, apenas 8 mil km estão
concedidos e 20 mil km precisam ser recuperados”, criticou. “O país já teve uma
malha maior do que a dos Estados Unidos. Mas parou no tempo. Está na hora de
voltar a favorecer a cultura de rede”, acrescentou.
O
governo assegurou que haverá competição. “Vários consórcios devem participar do
leilão, principalmente, compostos por estrangeiros, como chineses, espanhóis e
russos”, estimou o secretário Adalberto Vasconcelos, do PPI. Apesar da
confiança do governo de que os chineses entrarão na disputa pela FNS, de acordo
com fontes próximas às autoridades da China, é pouco provável que isso ocorra.
Analistas também lembraram que os chineses anunciaram interesse em construir
uma ferrovia para o Pacífico, via Peru, mas até agora tudo ficou na carta de intenções.
Vasconcelos
ressaltou que a perspectiva é de que o leilão ocorra no segundo trimestre deste
ano, com direito de passagem “garantido no edital”. O superintendente de
ferrovias da ANTT, Alexandre Porto, explicou que o dispositivo não é novidade.
“Existe desde 1997, quando o setor foi privatizado. O acesso ao porto de Santos
é um exemplo em que três concessionárias utilizam a mesma malha. No Norte, no
Porto de Itaqui, também”, ressaltou. Porto admitiu, contudo, que houve uma
discussão mais “profunda” sobre direito de passagem na modelagem econômica da
concessão da FNS.
Compartilhamento
Para o diretor executivo da Associação
Nacional de Transporte Ferroviário (ANTF), Fernando Paes, o compartilhamento da
infraestrutura por meio do direito de passagem é uma prática recorrente e
devidamente regulamentada no Brasil. “De acordo com os dados mais recentes da
ANTT, cerca de 10% do total das cargas transportas pelo modal ferroviário em
2017 ocorreu por meio desse dispositivo”, disse. “É uma prática regular, natural
e exercida há muito tempo, de forma contratual, entre as concessionárias. Não
por acaso não temos conhecimento de litígios em relação a direito de passagem
levados à agência reguladora”, acrescentou.
Porém, a
ANTF reconhece que, em alguns pontos da malha — como os acessos aos portos de
Santos e de Itaqui (MA) — há saturação e necessidade de novos investimentos. “A
solução de curto e médio prazos é a ampliação da capacidade por meio da
renovação dos contratos”, explicou Paes (leia mais amanhã).
Além da
FNS, Porto lembrou que mais duas ferrovias devem ser concedidas. “Estamos
trabalhando em outros processos. O edital da Ferrogrão, de Sinop a Miritituba,
temos chance de apresentar ao Tribunal de Contas da União (TCU) no início do
segundo semestre. A Ferrovia de Integração Leste Oeste-Fiol ainda está na fase
de estudos, pode ficar para 2019. Estamos discutindo a modelagem, precisamos
realizar audiência pública e o cronograma não foi definido”, afirmou. Conforme
Vasconcelos, do PPI, os estudos de viabilidade para a Fiol serão concluídos até
março.
Cronograma
O superintendente da ANTT disse que a
agência está preparando o certame licitatório e a previsão é que o leilão da
Norte-Sul ocorra no segundo trimestre de 2018, conforme o cronograma do PPI. A idéia
é protocolar no TCU (Tribunal de Contas da União) na semana que vem, mas pode
acontecer de ficar para a reunião de diretoria da próxima semana”, disse. A
estimativa de Alexandre Porto é de que a unidade técnica da corte de contas
avalie o edital em 45 dias. “Depois disso vai a plenário para virar acórdão. A
expectativa é publicar o edital em 60 dias”, destacou.
Correio Braziliense
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